Símbolo de luta e emancipação
A existência de Luiza Mahin vem a público, pela primeira vez, em uma carta escrita por seu filho, o escritor e um dos maiores abolicionistas do Brasil, Luiz Gama (Bahia, 1830 — São Paulo, 1882) em resposta ao pedido do amigo Lúcio Mendonça, em 25 de julho de 1880, que lhe pede informações para escrever a primeira biografia do ex-escravo. Neste depoimento, que é considerado uma espécie de Autobiografia de Gama, o filho dá luz à mãe:
“Sou filho natural de uma negra, africana livre, da Costa Mina, (Nagô de Nação) de nome Luiza Mahin, pagã, que sempre recusou o batismo e a doutrina cristã. Minha mãe era baixa de estatura, magra, bonita, a cor era de um preto retinto e sem lustro, tinha os dentes alvíssimos como a neve, era muito altiva, geniosa, insofrida e vingativa. Dava-se ao comércio — era quitandeira, muito laboriosa, e mais de uma vez, na Bahia, foi presa como suspeita de envolver-se em planos de insurreições de escravos, que não tiveram efeito. Era dotada de atividade. Em 1837, depois da Revolução do Dr. Sabino, na Bahia, veio ela ao Rio de Janeiro, e nunca mais voltou. Procurei-a em 1847, em 1856, em 1861, na Corte, sem que a pudesse encontrar. Em 1862, soube, por uns pretos minas, que conheciam-na e que deram-me sinais certos que ela, acompanhada com malungos desordeiros, em uma “casa de dar fortuna”, em 1838, fora posta em prisão; e que tanto ela como os seus companheiros desapareceram.”
O depoimento de Gama é o que se tem de mais concreto sobre a existência de Mahin, pois em função da escravidão, as lacunas sobre a história da população negra predominam e o processo de resgate do percurso de mulheres negras envolve registro histórico, memória coletiva, mitologia e às vezes imaginação. Conforme explica a estudiosa Lígia Ferreira Fonseca:
“Como um dos ingredientes de sua história são seus pais, estes ocupam um lugar central no relato. No entanto, tomadas ao pé da letra, as informações contidas nestes parágrafos iniciais alimentaram e continuam alimentando especulações, lendas e ficções em torno do próprio Gama, de seus pais, personagens ambíguos, e especialmente da figura materna.”
Porém, mais do que comprovar as informações biográficas, a importância de Luiza Mahin está no que ela representa: uma mulher negra, mãe, insurreta, que se rebela e não aceita injustiças, uma figura que se desdobra em poemas e romances, como “Mahin amanhã”, de Mirian Alves e o premiado Um defeito de cor, de Ana Maria Gonçalves. Essa heroína fascinante continuará sendo fonte de grande inspiração para a cultura brasileira.
Fontes bibliográficas:
ALVES, Mirian. Mahin amanhã. In: Cadernos negros n° 9. São Paulo: Edição dos autores (Quilombhoje), 1986, p. 46.
FERREIRA, Ligia Fonseca. Luiz Gama por Luiz Gama: carta a Lúcio de Mendonça. Teresa revista de Literatura Brasileira [819]; São Paulo, p. 300-321, 2008.
GONÇALVES, Ana Maria. Um defeito de cor. Rio de Janeiro: Record, 2006.
SCHWARZ, Roberto. Autobiografia de Luiz Gama. Novos Estudos CEBRAP, São Paulo, n° 25, outubro de 1989, p. 136-41.
Responsável: Mariana Diniz Mendes (Doutoranda no Programa de Pós Graduação em Literatura Brasileira - FFLCH/USP)